terça-feira, 21 de setembro de 2010

Apenas o nós



Apenas o nós

“Todos são livres para dançar e para se divertir, do mesmo modo que, desde a neutralização histórica da religião, são livres para entrar em qualquer uma das inúmeras seitas. Mas liberdade da escolha da ideologia, que reflete sempre a coerção econômica, revela-se em todos os setores como a liberdade de escolher o que é sempre a mesma coisa.”

T.W.Adorno

Até que ponto nossos pensamentos e atitudes são verdadeiramente nossos? Até que ponto conseguimos diferenciar as ideologias advindas de nossa essência das advindas da influência exterior? Existe uma fronteira que as limitem? Não, não há. Não há ponto. Nem mesmo existe campo para o que chamamos de “eu interior”. Tudo que você é, ou pensa que é, é, na verdade, um fruto, quase um filho, do que as pessoas querem que você seja. Assim, como também, as pessoas que estão a nossa volta não são elas mesmas, mas sim, fruto do que influenciamos elas a serem. E não há meio termo: tudo é influência, nada é original.

Isso significa que abolimos de vez aquilo que os ignorantes chamam de “ter personalidade?” Sim, se o significado de personalidade for associado ao pensamento medíocre, e egoísta, de que o homem tem um ser interior, com seus próprios ideais, por qual devemos dedicar toda nossa existência e jamais tentar mudá-lo, mesmo que isto signifique ir contra o bom convívio dos próximos. Atribuir personalidade a um ser que acreditamos ser o nosso “eu interior” só demonstra que esquecemos de que, quando nascemos, éramos cascas vazias chamadas “bebês”, cujas funções terrenas eram somente defecar e amar aquele que nos alimentava, desprovidas de qualquer ideologia consciente. Ideologia essa que só criamos, e continuamos a criar todos os dias, conforme somos influenciados no nosso viver.

Nada do que fazemos é original. Nem mesmo a atitude que por vezes julgamos tomar contra a maré pode ser considerada tal. A verdade é que o homem, em todo seu desejo de se reafirmar como humano, julga que, no exercício de sua utópica personalidade, adotar uma ideologia o diferenciará da maioria. Porém, tal atitude, no final, só demonstra que todo seu desejo é, na realidade, uma ilusão e que o que, verdadeiramente figura tal adoção, é a subjetiva revelação de coerções econômicas. E neste ponto, não há nada mais comum do que ser influenciado a adotar ideologias que favoreçam a sua pessoa.

O homem não é um ser único. Ele é a fusão de ideologias e sentimentos de todos que estão a sua volta. Como uma gigantesca teia, o mundo interconecta as mentes de todos os seres viventes em um colossal tráfego de influências. Note que interconectar não significa um “pensamento” ou “tendência” universal, mas sim que tudo influencia as ações de todos. Portanto, por mais que anti-liberdade que possa parecer: não existe o eu, apenas o nós.

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