domingo, 30 de maio de 2010

Carta ao renascido Machado de Assis





Carta ao renascido Machado de Assis:

Rio de Janeiro, 23 de maio de 2010.

Caro Machado de Assis,

Já que voltaste da eternidade, algo que, digamos, é muito raro hoje em dia, nada mais natural do que tratá-lo como um candidato a ser o “Salvador” desta cidade. Obviamente, não preciso lhe explicar como sobreviver nela, pois já aprendeste no momento em que reviveu, pois, se não o tivesse feito, com o ritmo desta estressada cidade, já estarias de novo morto. Meu intuito com esta carta é apenas lhe explicar como chegamos a esta caótica situação para que, desta forma, reconheça nos cidadãos cariocas o desejo pela vida que há muito lhes é negada, e assim, talvez, possas ajudá-los.

Lembre-se de tua infância pelas vielas do Morro do Livramento, onde desde cedo, perdera a inocência da vida na busca pelos teus sonhos. Hoje, só o que podemos vislumbrar são nossos morros gerando crianças igualmente sem inocência, mas também, sem nenhum sonho. O êxodo rural, aliado ao descaso de nosso governo corrupto quanto ao crescimento populacional de nossa cidade ao longo de tantos anos, superlotou nossos cortiços, e posteriormente, lotando até mesmo as periferias que são, na verdade, favelas oficiais fundadas com o dinheiro público. Quando puderes, assistas “Cidade de Deus” ou leias sobre a origem da “Vila Kennedy” e verás que, as favelas não são mais somente os lares de quem não tem onde morar, e sim, verdadeiras escolas de violência onde coexistem a raiva e a ignorância.

Pior ainda, é vermos, todos os dias, os limites destas “áreas de violência” serem cada vez mais abrangentes. Aliás, vermos tudo isto e vislumbrarmos os, teoricamente, nossos defensores não fazerem nada. Não há como não criticar o governo quando falo sobre os problemas de nossa cidade. Meu corpo se inflama só de pensar na palavra “político”. O povo carioca já não agüenta mais tanta corrupção e descaso quanto à nossa cidade. Faltam hospitais. Faltam escolas. Faltam até mesmo transportes e vias decentes para se ir trabalhar. O governo carioca, não satisfeito em isolar as periferias pela distância ao Centro, também não oferece sequer meio digno para o trabalhador ir ao emprego se matar de trabalhar. “Se matar de trabalhar” pois isto é a única coisa que essa vida infeliz lhes oferece. E assim, o trânsito fica confuso, fica estressado, fica parado. E tu perdes a pouca paciência que lhe resta, grita com o motorista do lado e volta de novo à cova com o tiro que levastes do motorista irritado do outro carro.

Questiono o senhor se perguntaste ao nosso bondoso Deus se é isto mesmo que está destinado aos cariocas desta cidade. Peço que, ou melhor, suplico a tua pessoa que ajudes este povo, visto que o último que ressuscitou foi o nosso Cristo que, de braços abertos, só deu as costas às periferias desta que outrora foi chamada de Cidade Maravilhosa.

Com a fé de que nos ajudará,

Alguém que mora na periferia.

0 comentários: